Os primeiros anos de vida de uma criança são muito importantes para a saúde e o desenvolvimento posterior. Durante a gestação e a primeira infância, o cérebro das crianças cresce e evolui muito rápido – e, embora continue a se desenvolver e mudar até a idade adulta, os primeiros 8 anos podem construir uma base cerebral importante para a sua capacidade de aprendizado futuro, assim como de saúde e sucesso na vida.
Para aprender e crescer adequadamente, o cérebro de um bebê deve ser saudável e protegido de doenças e outros riscos. Além disso, o desempenho do cérebro depende de muitos fatores além dos genes, principalmente uma nutrição adequada desde a gravidez, a não exposição a toxinas ou infecções, e as experiências da criança com outras pessoas e o mundo.
Nutrir e cuidar bem do corpo e da mente da criança é a principal chave para incentivar o desenvolvimento saudável do cérebro. As experiências positivas ou negativas podem contribuir para moldar o desenvolvimento da criança e podem ter grandes efeitos ao longo da vida.
Assim, o cuidado certo com as crianças, começando antes do nascimento e continuando durante a infância, garante que o cérebro da criança cresça bem e atinja todo o seu potencial. Neste artigo, vamos entender melhor estas principais chaves para promover o desenvolvimento neurológico saudável da criança.
Confira a seguir!
Preparando um caminho saudável para a criança
A promoção do desenvolvimento de um cérebro saudável deve começar antes mesmo da gravidez. Uma dieta saudável e os nutrientes certos, como ácido fólico suficiente, é o caminho para uma gravidez sadia e um sistema nervoso bem desenvolvido no bebê em crescimento. A vacinação, por sua vez, ajuda a proteger as mulheres grávidas de infecções que podem prejudicar o cérebro do feto.
Durante a gravidez, o cérebro da criança pode ser afetado por muitos tipos de riscos: por doenças infecciosas como citomegalovírus ou zika vírus; por exposição a toxinas, incluindo fumo ou álcool; ou quando as mães grávidas passam por estresse, trauma ou problemas de saúde mental como depressão. Assim, cuidados de saúde regulares durante a gravidez podem ajudar a prevenir diversas complicações, até mesmo o parto prematuro, que pode afetar seriamente o cérebro do bebê.
Depois do nascimento, o crescimento saudável do cérebro na infância continua a depender de cuidados e nutrição adequados. Como o cérebro das crianças está em pleno crescimento, elas são especialmente vulneráveis a lesões traumáticas na cabeça, infecções ou toxinas, como chumbo. Esta é outra grande importância das vacinas infantis, como a vacina contra o sarampo, pois podem proteger as crianças de complicações perigosas, como o inchaço do cérebro. Garantir acesso a alimentos saudáveis e locais para morar e brincar que sejam saudáveis e seguros para seus filhos é a melhor maneira de fornecer cuidados mais nutritivos.
A importância de uma nutrição adequada na gravidez e na infância
O peso de um bebê ao nascer, assim como o tamanho do seu cérebro, dependem da qualidade da nutrição de sua mãe durante a gravidez. As mulheres grávidas devem ganhar cerca de 20 por cento de seu peso ideal antes da gravidez para garantir o crescimento fetal adequado. Isso requer o consumo de 300 calorias extras por dia, incluindo 10-12 gramas extras de proteína. [1]
Vários nutrientes desempenham um papel importante na construção do cérebro durante a gravidez. Estes incluem ferro, proteína, cobre, folato, zinco, iodo e certas gorduras. Zinco, em particular, apoia o desenvolvimento do sistema nervoso, o hipocampo e o cerebelo, enquanto o ferro afeta as fibras nervosas – relacionadas à velocidade de processamento do cérebro. Já os ácidos graxos poliinsaturados – normalmente encontrados no leite materno, óleos de peixe e gemas de ovo – desempenham um papel central no desenvolvimento saudável e funcionamento do cérebro e dos olhos. [2,3]
Após o nascimento, o crescimento do cérebro depende criticamente da qualidade da nutrição de uma criança. O leite materno oferece a melhor combinação de nutrientes para promover o crescimento do cérebro, mas ainda é importante atentar a alguns cuidados. É recomendado, por exemplo, que os bebês recebam alguma forma de suplementação de ferro por volta dos seis meses de idade.
A maioria dos cereais infantis é fortificada com ferro, e os bebês precisam dessa suplementação aos seis meses, independentemente de suas mães serem ou não deficientes em ferro. A deficiência de ferro tem sido claramente associada a déficits cognitivos em crianças pequenas, e o ferro é essencial para manter um número adequado de células vermelhas no sangue, responsáveis por transportar oxigênio e extremamente necessárias para alimentar o crescimento do cérebro.
Além disso, a dieta da mãe é a única fonte de nutrição para o bebê em desenvolvimento. Quando uma mulher grávida não recebe as calorias, chave nutrientes ou proteínas essenciais de que ela precisa para sustentar o desenvolvimento de seu bebê, seu bebê está em risco de sofrer com déficits cognitivos, no desenvolvimento, e defeitos congênitos.
Por exemplo, o folato é fundamental para o desenvolvimento do cérebro e da coluna. Quando uma mulher não tem ácido fólico suficiente antes de engravidar e nas primeiras semanas de gravidez, o desenvolvimento do tubo neural pode dar errado, levando a defeitos congênitos do cérebro e da coluna que podem causar a morte ou deficiência ao longo da vida. Por isso, o Center for Disease Control (CDC) recomenda que as mulheres tomem uma vitamina com 400 microgramas (mcg) de ácido fólico todos os dias, antes e durante a gravidez. [4]
Por causa do ritmo acelerado da mielinização no início da vida, as crianças precisam de um alto nível de gordura em suas dietas – cerca de 50% de suas calorias totais – até os dois anos de idade. Os bebês devem receber a maior parte dessa gordura do leite materno ou da fórmula no primeiro ano de vida, e o leite materno continua sendo uma excelente fonte de nutrição durante os primeiros anos de vida. No entanto, o leite de vaca integral pode ser introduzido após o primeiro aniversário e também pode fornecer uma excelente fonte de gordura e proteína para crianças no segundo ano. Após os dois anos de idade, as crianças devem começar a transição para um nível de gordura alimentar mais saudável para o coração (não mais do que 30 por cento do total de calorias), incluindo leite de vaca com baixo teor de gordura (1 ou 2%).
Quando se trata de desenvolvimento do cérebro, o leite materno é um superalimento. O leite materno contém uma variedade de nutrientes, fatores de crescimento e hormônios que são vitais para o desenvolvimento do cérebro de uma criança. Como o leite materno é uma substância viva com componentes únicos que não pode ser replicado em fórmulas infantis, seu impacto sobre o desenvolvimento do cérebro é incomparável. Usando tecnologias de neuroimagem, os cientistas foram capazes de ver que crianças que foram amamentadas exclusivamente (sem comida ou líquidos, exceto leite materno) por pelo menos 3 meses tiveram aumento de desenvolvimento de matéria branca em várias regiões do cérebro, associadas ao funcionamento executivo, planejamento, funcionamento socioemocional e linguagem. [5]
O perigo da toxicidade do ambiente
O desenvolvimento do cérebro começa no início da vida do embrião e continua muito além do nascimento até a adolescência. Durante o desenvolvimento, as células cerebrais devem dividir, migrar, diferenciar, estabelecer conexões sinápticas e submeter-se à morte celular (apoptose) em uma orquestrada sequência de eventos controlados por neurotransmissores e outros fatores neurotróficos.
Interferência com qualquer estágio desta cascata de eventos pode alterar estágios subsequentes, de modo que mesmo interrupções de curto prazo podem ter efeitos de longo prazo mais tarde na vida.
Apesar dos desafios inerentes ao estudo de distúrbios do neurodesenvolvimento em crianças, uma grande literatura documenta conclusivamente os efeitos de alguns agentes ambientais [6]. É bem estabelecido, por exemplo, que a exposição fetal ou infantil ao chumbo, álcool ou nicotina prejudica o desenvolvimento neuropsicológico normal. A exposição fetal ao álcool, por sua vez, causa hiperatividade e déficits cognitivos [7].
O tabagismo materno causa déficits de quociente de inteligência (QI), de aprendizado e de atenção [8]. Exposição precoce ao chumbo diminui o aprendizado, a atenção e o QI, enquanto também contribui para a hiperatividade, impulsividade, e agressão [9,10].
Incentivando o desenvolvimento intelectual e social da criança
Para incentivar o desenvolvimento intelectual e social da criança é preciso reconhecer o que o cérebro em desenvolvimento de uma criança precisa:
- Experiências responsivas, estimulantes e positivas. As experiências cotidianas ajudam a moldar o cérebro da criança – desde suas rotinas diárias até as pessoas com as quais ele em contato.
- Atividades divertidas. Falar, ler e cantar para o bebê são maneiras divertidas e fáceis de ajudá-lo a crescer. O mesmo ocorre com jogos simples, como deitar no chão para ficar de bruços com seu bebê ou brincar de esconde-esconde com seu filho de 5 meses.
- Boa alimentação. Pense na hora da alimentação como um momento de construção do cérebro: fazer contato visual, sorrir e ter contato com a pele são experiências positivas. Conforme a criança cresce, certifique-se de oferecer alimentos com uma variedade de nutrientes – como frutas e vegetais.
- Seu bebê não precisa de brinquedos caros. Os rostos amorosos e sorridentes dos adultos são os melhores brinquedos para uma criança. Muitos brinquedos eletrônicos e programas são comercializados como “educacionais” para bebês, mas não há pesquisas que sustentem as afirmações de que esses produtos ajudam os bebês a aprender. Assistir a uma tela é passivo. Os bebês precisam interagir ativamente com outras pessoas e explorar seu mundo. Além disso, o tempo de tela não é recomendado para crianças menores de 2 anos.
A partir disso, o que você pode fazer para apoiar um desenvolvimento saudável?
- Responda ao seu bebê. Isso é especialmente importante quando seu bebê está doente, com fome ou apenas precisa de algum conforto. Mas os bebês também procuram você de inúmeras maneiras positivas – balbuciando, fazendo sons ou sorrindo. Quando você responde de uma forma amorosa e consistente, você ajuda o cérebro do seu bebê a se desenvolver.
- Ofereça um lar seguro e amoroso. Desenvolva rotinas diárias com as quais a criança pode contar. Mantenha sua casa calma.
- Ajude seu bebê a explorar o mundo. Brincar ajuda os bebês a aprender, e você é o primeiro companheiro de brincadeiras de seu filho. Jogar jogos simples irá ajudá-los a aprender sobre as pessoas e o mundo ao seu redor. E lembre-se de conversar com seu bebê enquanto você faz suas rotinas diárias. Conte ao seu bebê o que está acontecendo, aponte coisas interessantes que vocês veem juntos e ajude-os a desenvolver seus outros sentidos – audição, tato, paladar e olfato.
- Obtenha cuidados de saúde regulares. Uma criança deve ser examinada por um profissional de saúde regularmente. Mantenha as vacinas atualizadas e converse com o pediatra para tirar todas suas dúvidas.
- Escolha creches de qualidade. Quando precisar ficar longe de seu bebê, certifique-se de deixá-lo com alguém em quem você confie e que irá atender às necessidades emocionais do seu bebê. É importante fornecer um ambiente seguro e saudável com oportunidades de aprender e crescer.
- Entre em contato se precisar de ajuda. Se você sentir que precisa de algum apoio para cuidar de seu bebê, não tenha medo de pedir ajuda. Converse com sua família ou entre em contato com um profissional da saúde.
Você gostou das dicas para promover o desenvolvimento saudável da criança? Ficou com dúvidas sobre o assunto? Deixe seu comentário ou entre em contato comigo!
Referências
Centers for Disease Control and Prevention. Early Brain Development and Health. Disponível em: https://www.cdc.gov/ncbddd/childdevelopment/early-brain-development.html
1,000 DAYS – NUTRITION IN THE FIRST 1,000 DAYS: A Foundation for Brain Development and Learning.
Schettler, T. Toxic Threats to Neurologic Development of Children. Environmental Health Perspectives. Vol 109, Supplement 6, December 2001.
[1] Zero to three. How does nutrition affect the developing brain? Disponível em: https://www.zerotothree.org/resources/1372-how-does-nutrition-affect-the-developing-brain
[2] Georgieff M.K., Rao R. & Fuglestad A.J. (1999). The role of nutrition in cognitive development. In: Handbook of Developmental Cognitive Neuroscience (editors Nelson, C.A, Luciana, M.). Cambridge, MA: MIT Press; p. 491-504.
[3] National Institutes of Health. (2011). Iodine: Fact Sheet for Health Professionals. Retrieved from:https://ods.od.nih. gov/factsheets/Iodine-HealthProfessional.
[4] Williams, J. et al. (2015). Updated Estimates of Neural Tube Defects Prevented by Mandatory Folic Acid Fortification in the United States 1995 – 2011. Morbidity and Mortality Weekly Report. 64(01);1-5.
[5] Deoni, S.C.L., et al. (2013). Breastfeeding and Early White Matter Development: A cross-sectional study. NeuroImage, 82: 72-86.
[6] Schettler T, Stein J, Reich F, Valenti M. In Harm’s Way: Toxic Threats to Child Development. Boston: Greater Boston Physicians for Social Responsibility, 2000.
[7] Nulman I, O’Haydon B, Gladstone J, Koren G. The effects of alcohol in the fetal brain. In: Handbook of Developmental Neurotoxicology (Slikker W, Chang LW, eds). San Diego, CA:Academic Press, 1998.
[8] Eskenazi B, Castorina R. Association of prenatal maternal or postnatal child environmental tobacco smoke exposure and neurodevelopmental and behavioral problems in children. Environ Health Perspect 107:991–1000 (1999).
[9] Rice DC. Developmental lead exposure: neurobehavioral consequences. In: Handbook of Developmental Neurotoxicology (Slikker W, Chang LW, eds). San Diego, CA:Academic Press, 1998.
[10] Needleman HL, Reiss JA, Tobin MJ, Biesecher G, Greenhouse J. Bone lead levels and delinquent behavior. JAMA 275:363–369 (1996).