O câncer de mama é um dos cânceres mais comuns diagnosticados em mulheres em todo o planeta, sendo o quinto câncer que mais mata no mundo, e o segundo que mais mata mulheres. No entanto, a predisposição genética é responsável por uma pequena parcela do total de incidências de câncer de mama. Por isso, muitos fatores de estilo de vida também têm sido associados à doença, como tabagismo, consumo de álcool e obesidade.
Estudos emergentes mostram que os poluentes ambientais também podem desempenhar um papel importante. Suspeita-se que o bisfenol-A (BPA) contribui para o desenvolvimento do câncer de mama e afeta o desenvolvimento da glândula mamária, entre outros efeitos.
Até o momento, estudos e dados clínicos indicaram que os hormônios, incluindo o estrogênio, a progesterona e a prolactina, desempenham papéis importantes na iniciação e progressão do câncer de mama. Neste contexto, o bisfenol A (BPA) é um dos desreguladores endócrinos mais comumente usados e amplamente estudados, pois pode ser liberado de produtos de consumo e depositado no meio ambiente, criando potencial para exposição humana por via oral, inalatória e dérmica.
Pela facilidade de contato com esta substância, os níveis de contaminação da população já estão em números alarmantes. Em pesquisa do Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos, no Inquérito Nacional de Saúde e Nutrição de 2003-2004, foram encontradas concentrações significativas de BFA em 92,6% dos exames de urina realizados em um estudo com 2.517 participantes com mais de 6 anos de idade, o que demonstra a presença da substância no organismo desde a infância.
Neste artigo vamos compreender melhor qual é o papel do Bisfenol-A no câncer de mama. Confira!
Sobre o Bisfenol A
O bisfenol A (também conhecido como BPA) é muito utilizado na fabricação de plásticos de policarbonato. Desta forma, é o constituinte de uma ampla gama de produtos de consumo, incluindo recipientes de plástico para alimentos, mamadeiras e o revestimento de latas de metal para alimentos. Por conta destas utilizações, acredita-se que a principal via de contaminação seja a própria comida. .
O BPA é capaz de acelerar o crescimento e a puberdade, alterar o ciclo ovariano nas mulheres, interferir no desenvolvimento embrionário e induzir aneuploidia (mutações que envolvem mudanças no número de cromosossomos, que levam ao aborto ou ao nascimento com síndromes genéticas). Além disso, já foi encontrada uma relação entre os níveis sanguíneos de BPA, com obesidade, síndrome dos ovários policísticos, aborto espontâneo de repetição e hiperplasia endometrial, indicando que pode atuar como um desregulador endócrino. Por fim, a exposição ao BPA também foi correlacionada com a incidência de diversos tipos de tumores.
Qual é a o papel do Bisfenol-A no câncer de mama?
Por causa de suas ações estimuladoras no desenvolvimento da glândula mamária, os hormônios, especialmente os estrogênios, há muito tempo são associados ao aumento do risco de desenvolver câncer de mama. O BPA tem atividade estrogênica tanto in vivo quanto in vitro e, por isso, é considerado um estrogênio ambiental.
Por conta disso, o BPA é capaz de interagir com os recipientes de estrogênio do corpo humano, desregulando as suas funções no organismo e desencadeando uma série de reações. Além disso, este processo pode ocorrer em qualquer fase da vida, sendo observado mesmo em estágio pré-natal.
Múltiplas linhas de evidência demonstram que a exposição fetal a baixas doses de BPA altera a proliferação celular, apoptose e o tempo de desenvolvimento das glândulas mamárias, o que pode predispor ainda mais a glândula mamária à carcinogênese. Na verdade, o BPA aumenta a densidade ductal e a sensibilidade aos estrogênios após a exposição ao BPA, que geralmente é mostrada na carcinogênese da mama humana.
O que dizem os estudos?
Para compreendermos melhor a relação entre o BPA e o câncer de mama, vamos usar como base as conclusões dos principais estudos realizados sobre o assunto:
- Um estudo realizado por Lozada e Keri [1] com ratos examinou o impacto da exposição ao BPA na programação fetal da suscetibilidade do tumor mamário, bem como seus efeitos de promoção de crescimento em células de câncer de mama. Nos casos de exposição ao BPA em fase fetal, tanto os indivíduos que receberam baixas doses quanto os que receberam altas doses tiveram um aumento significativo na susceptibilidade a desenvolver tumores. Da mesma forma, todos os ratos que já possuíam células de câncer de mama em seus corpos e foram contaminados com o BPA desenvolveram tumores em um prazo de 7 semanas após a exposição – enquanto não foi observado o desenvolvimento de nenhum caso no grupo de controle que não recebeu a substância. Assim, ambos os resultados indicam que a exposição ao BPA em diferentes fases da vida aumenta o risco de desenvolver câncer mamário, mesmo quando em baixas dosagens.
- Embora o BPA tenha uma taxa de eliminação rápida do corpo, estudos o encontraram em amostras de sangue e urina de mulheres grávidas, [2] [3] leite materno, líquido amniótico, [4] tecido placentário e sangue do cordão umbilical no nascimento [5] e urina de bebês prematuros. Isso é bastante preocupante, considerando a crescente evidência que liga o BPA a efeitos adversos à saúde.
- A exposição pré-natal de ratos ao BPA resultou em um aumento de lesões pré-cancerosas e grupos de células anormais, bem como um aumento no número de tumores mamários após exposições de adultos a doses abaixo do limiar de carcinógenos conhecidos. Estudos posteriores demonstraram que o BPA sozinho também aumentou o crescimento de tumores mamários, sem a adição de carcinógenos conhecidos. [6]
- Alguns dados sugerem que durante o tempo entre a concepção e o nascimento, o BPA altera o conteúdo e a expressão de várias proteínas em algumas células, o que acaba modificando a expressão gênica na glândula mamária. [7]
- Alguns dos efeitos de longo prazo das exposições neonatais ao BPA podem ser dependentes da dose, com exposições a baixas e altas doses resultando em diferentes momentos e perfis de mudanças na expressão gênica nas células da glândula mamária. Em um estudo, exposições a baixas doses tiveram o efeito mais profundo nas glândulas mamárias de ratos durante o período imediatamente antes da maturidade reprodutiva, enquanto doses mais altas tiveram efeitos mais retardados, alterando a expressão gênica nos tecidos mamários de adultos maduros. [8]
- A exposição a baixos níveis de BPA em células de mama humanas normais e cancerosas levou à expressão de genes alterados, incluindo morte celular, rápido aumento na formação de células e o início da formação de câncer. Na presença de BPA, tumores altamente agressivos foram desenvolvidos em células da mama não cancerosa de mulheres com diagnóstico de câncer de mama. [9]
- Verificou-se que o BPA reduz a eficácia de agentes quimioterápicos comuns (cisplatina, doxirrubicina e vinblastina) no bloqueio da proliferação de células de câncer de mama humano quando testado in vitro. [10]
Como evitar a exposição ao BPA?
Felizmente, a eliminação do BPA do corpo é bastante rápida. Um estudo demonstrou que apenas um período de três dias limitando a ingestão de alimentos embalados diminuiu as concentrações de BPA encontradas na urina em uma média de 65%.
Fazer essas mudanças simples pode reduzir sua exposição ao BPA:
- Evite alimentos enlatados. Onde novas alternativas não estiverem disponíveis, escolha congelados.
- Evite recipientes de plástico transparentes e inquebráveis para alimentos e bebidas.
- Evite manusear papel térmico (como recibos e notas fiscais).
- Escolha mamadeiras e copos infantis sem BPA. Recipientes de vidro e aço inoxidável são sua aposta mais segura. Rótulos sem BPA infelizmente nem sempre significam que o produto é seguro.
- Evite esquentar ou congelar alimentos em recipientes de plástico.
Além desses cuidados, é sempre importante seguir as recomendações de um profissional de saúde!
Você já conhecia o papel do Bisfenol-A no câncer de mama? Ficou com alguma dúvida sobre o assunto? Entre em contato comigo! Ficarei muito feliz em ajudá-lo.
Referências
[1] Bisphenol A Induces Gene Expression Changes and Proliferative Effects through GPER in Breast Cancer Cells and Cancer-Associated Fibroblasts
[2] Ye, Xibiao et al. “Levels of metabolites of organophosphate pesticides, phthalates, and bisphenol A in pooled urine specimens from pregnant women participating in the Norwegian Mother and Child Cohort Study (MoBa).” International Journal of Hygiene and Environmental Health 212, 5 (2009): 481-91. doi:10.1016/j.ijheh.2009.03.004.
[3] Teeguarden Justin G, Nathan C. Twaddle, Mona I. Churchwell and Daniel R. Doerge. “Urine and serum biomonitoring of exposure to environmental estrogens I: Bisphenol A in pregnant women.” Food and Chemical Toxicology 92 (2016): 129-142. https://doi.org/10.1016/j.fct.2016.03.023.
[4] Ikezuki, Yumiko et al. “Determination of bisphenol A concentrations in human biological fluids reveals significant early prenatal exposure.” Human Reproduction 17,11 (2002): 2839-41. doi:10.1093/humrep/17.11.2839.
[5] Schönfelder, Gilbert et al. “Parent bisphenol A accumulation in the human maternal-fetal-placental unit.” Environmental Health Perspectives 110,11 (2002): A703-7. doi:10.1289/ehp.110-1241091.
[6] Acevedo, Nicole et al. “Perinatally administered bisphenol a as a potential mammary gland carcinogen in rats.” Environmental Health Perspectives 121,9 (2013): 1040-6. doi:10.1289/ehp.1306734.
[7] Ibrahim, Marwa A A et al. “Effect of bisphenol A on morphology, apoptosis and proliferation in the resting mammary gland of the adult albino rat.” International Journal of Experimental Pathology 97, 1 (2016): 27-36. doi:10.1111/iep.12164.
[8] Moral, Raquel et al. “Effect of prenatal exposure to the endocrine disruptor bisphenol A on mammary gland morphology and gene expression signature.” The Journal of Endocrinology 196,1 (2008): 101-12. doi:10.1677/JOE-07-0056.
[9] Dairkee, Shanaz H et al. “Bisphenol A induces a profile of tumor aggressiveness in high-risk cells from breast cancer patients.” Cancer Research 68, 7 (2008): 2076-80. doi:10.1158/0008-5472.CAN-07-6526.
[10] LaPensee, Elizabeth W et al. “Bisphenol A and estradiol are equipotent in antagonizing cisplatin-induced cytotoxicity in breast cancer cells.” Cancer Letters 290, 2 (2010): 167-73. doi:10.1016/j.canlet.2009.09.005.
WANG, Z.; LIU, H.; LIU, S. Low‐Dose Bisphenol A Exposure: A Seemingly Instigating Carcinogenic Effect on Breast Cancer. Advanced Science. 2016, n. 4, issue 2. Doi: https://doi.org/10.1002/advs.201600248
LOZADA, K. W.; KERI, R. A. Bisphenol A Increases Mammary Cancer Risk in Two Distinct Mouse Models of Breast Cancer, Biology of Reproduction, Volume 85, Issue 3, 1 September 2011, Pages 490–497, https://doi.org/10.1095/biolreprod.110.090431
PUPO, M.; PISANO, A.; LAPPANO, R.; et al. Bisphenol A Induces Gene Expression Changes and Proliferative Effects through GPER in Breast Cancer Cells and Cancer-Associated Fibroblasts. Environmental Health Perspectives, Vol. 120, No. 8, 2012. Doi: https://doi.org/10.1289/ehp.1104526