“Para medicar uma doença epidêmica, é necessário antes de tudo anotar os sintomas que diversos doentes apresentam”. Parece bastante lógico, não é mesmo? É esse o conceito que está por trás do gênio epidêmico – que se refere à melhor medicação para prevenir e tratar os sintomas de uma epidemia.
Com base nesse conceito, a homeopatia exerce um papel de grande importância em momentos de epidemias – conseguindo encontrar os medicamentos mais eficazes para auxiliar a população.
Neste artigo vamos entender melhor o que significa o termo “gênio epidêmico” e como a homeopatia contribui em epidemias. Acompanhe.
O que é gênio epidêmico?
O conceito de gênio epidêmico se originou com Hipócrates e foi retomado posteriormente por Paracelso (1493-1541), que indicou a necessidade de encontrar o medicamento específico para cada epidemia. Ele escreveu “Se você não conseguir achar o remédio específico para cada epidemia, todo seu esforço para curar é em vão”.
Esta ideia é resgatada novamente por Samuel Hahnemann, o fundador da Homeopatia, em 1796. Ele se refere ao medicamento mais comumente indicado em uma determinada epidemia ou pandemia, e tem demonstrado maiores poderes curativos em um número máximo de pacientes.
A lógica por trás do gênio epidêmico é bem simples: com base nos sintomas identificados nos pacientes de uma doença epidêmica, é realizada uma busca por um medicamento homeopático que sirva para a maior parte desses sintomas – sendo que esse remédio pode ser usado tanto para tratar os doentes como para prevenção.
O gênio epidêmico segue a mesma lei da semelhança que norteia toda a homeopatia, com o entendimento de que uma substância que provoca sintomas em uma pessoa saudável pode ser usada para tratar os mesmos sintomas em outra doente.
Para compreender melhor como isso funciona, podemos utilizar como exemplo os remédios homeopáticos criados para prevenir e tratar a dengue. Para isso, foi utilizada a Eupatorium perfoliatum, uma planta americana que provoca em indivíduos saudáveis dores no corpo, nas costas, na cabeça e nas articulações, além de febre – que são sintomas muito semelhantes aos dos pacientes com dengue.
Foi preparado um medicamento seguindo a farmacotécnica homeopática com a Eupatorium para tratar esses doentes. Residentes de São José do Rio Preto (SP) e Macaé (RJ) tomaram Eupatorium de maneira preventiva, sozinho ou em conjunto com outros remédios homeopáticos também adequados para a dengue, e foi registrado um número menor de doentes nessas áreas.
Uso do gênio epidêmico ao longo dos anos
Apenas 3 anos após o advento da homeopatia, Hahnemann ganhou fama na Europa pelo seu tratamento excepcionalmente efetivo da febre escarlatina, uma epidemia que varreu a Alemanha no final dos anos 1700. Em seu artigo intitulado Ensaio sobre um Novo Princípio, ele descreve o trabalho realizado na busca pela cura da escarlatina:
“Eu resolvi, neste caso de escarlatina, não agir como de costume em relação aos sintomas individuais, mas se possível (de acordo com meu novo princípio sintético) para obter um remédio cujo modo de ação peculiar era calculado para produzir no corpo a maioria dos sintomas mórbidos que observei combinados nesta doença. Minha memória e minha coleção escrita sobre os efeitos peculiares de alguns medicamentos não me forneceram tão capaz de produzir uma contrapartida dos sintomas aqui presentes como a Belladona.“
Hahnemann utilizava para o tratamento da escarlatina 4 diferentes medicamentos homeopáticos: Belladona, Opium, Ipecacuanha e Camomila. No entanto, o remédio mais indicado e que possuía efeito curativo na maior parte dos pacientes era a Belladona, o que demonstra o êxito que Hahnemann teve em compreender que este era o gênio epidêmico da doença. O mesmo sucesso foi corroborado por outros médicos que utilizaram a Belladona novamente para tratar um novo surto de escarlatina na década de 1820.
Ao longo dos anos, a eficácia do gênio epidêmico no tratamento de doenças com a homeopatia foi observada em outras epidemias, como nas epidemias de cólera asiática na Europa entre 1831-1832 e 1849, de difteria em Nova Iorque entre 1862-1864, ou de gripe espanhola nos Estados Unidos em 1921. Em um exemplo mais próximos, a homeopatia também foi utilizada com a prescrição de Lathyrus Sativus durante a epidemia de poliomielite em Buenos Aires em 1957 e em 1975, e no tratamento da dengue com Eupatorium aqui no Brasil.
No entanto, existe um grande número de registros do sucesso dos tratamentos homeopáticos na história. Uma tabela com o levantamento histórico de algumas epidemias e suas iniciativas de medicação está ao final do artigo.
Gênio epidêmico no combate ao coronavírus
Nas epidemias que teve contato, Hahnemann observava fases diferentes na evolução da doença prescrevia medicamentos diferentes para cada uma delas. Um bom exemplo disso pode ser notado na epidemia de escarlatina: na fase inicial e como profilático ele indicava Belladonna, numa segunda fase Opium e numa fase mais grave Ipecacuanha.
O gênio epidêmico está em conflito aparente com a metodologia homeopática de estrita individualização, que é a chave fundamental para o sucesso na homeopatia, mas nas epidemias podemos tentar individualizar a doença coletiva em vez de cada caso afetado pela doença epidêmica. A seleção do medicamento deve ser a partir da totalidade dos sintomas epidêmicos, e não de um caso epidêmico individual. Nem sempre é fácil encontrar um remédio para uma epidemia inteira, especialmente durante uma pandemia. O gênio epidêmico tende a mudar de uma área climática para outra, da costa para as montanhas. O gênio epidêmico pode ser diferente para os diferentes estágios de uma epidemia na mesma localidade.
Levando essa metodologia em consideração, a Covid-19 merece uma atenção semelhante – principalmente considerando a evolução dos sintomas, a sintomatologia variada e as diferenças de indivíduo para indivíduo. Além disso, a sintomatologia ainda pode variar de país ou população diferentes. Ou seja, trata-se de uma doença com muitas variáveis a serem consideradas para o seu tratamento efetivo.
Com base nisto, foi elaborado um estudo preliminar de sintomas e medicamentos prevalentes do gênio epidêmico da pandemia de COVID-19 no Brasil – que foi publicado em abril por meio do Comitê Especial de Pesquisa COVID-19 da AMHB (Associação Médica Homeopática Brasileira). Trata-se de um estudo piloto com objetivo de observar os sintomas característicos do primeiro estágio da doença para se chegar a medicamentos do gênio epidêmico.
Além deste comitê, também no Brasil foi instituída a “Comissão Brasileira de Homeopatia para Definição e Utilização do Gênio Epidêmico da COVID-19”, dirigida pelo homeopata Dr. Carlos Eduardo Leitão. Esta comissão elaborou um projeto de ação conjunta, balizado pela metodologia homeopática, para a construção do Gênio Epidêmico desta epidemia. O trabalho consistiu na definição dos medicamentos homeopáticos que correspondam ao gênio epidêmico da COVID-19.
Os pesquisadores, após analisarem o quadro da doença em pacientes brasileiros, elaboraram a utilização de um questionário padronizado para casos clínicos ambulatoriais e hospitalares aplicado a doentes sintomáticos e com o teste para Covid19 confirmado. Encontrou-se não um único medicamento, mas um grupo de medicamentos que correspondem às possibilidades de gênio epidêmico e que possam vir a auxiliar no acompanhamento e restabelecimento da população/doentes afetados nesta pandemia.
Esses tratamentos, assim como outros propostos pela pesquisa atenta de médicos homeopatas do mundo todo têm sido aplicados no tratamento da Covid-19, com resultados impactantes e exitosos.
Por isso, esses estudos piloto, podem ser considerados o início para novos estudos clínicos e protocolos experimentais, no segmento da homeopatia, no enfrentamento da COVID-19.
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Você já conhecia o conceito de gênio epidêmico e o papel da homeopatia em epidemias? Ficou com alguma dúvida sobre o assunto? Deixe o seu comentário que ficarei muito feliz em esclarecer suas questões!
Fonte: Renu Bala et.al. Historical journey of homoeopathy during epidemic diseases in the light of 2019 novel coronavirus pandemic. International Journal of Science and Healthcare Research (www.ijshr.com), Vol.5; Issue: 2; April-June 2020.
Referências
Dolce Filho, R.; Nechar, R. C.; Ribeiro Filho, A. ESTUDO PRELIMINAR DE SINTOMAS E MEDICAMENTOS PREVALENTES DO “GÊNIO EPIDÊMICO” DA PANDEMIA DE COVID-19 NO BRASIL. Comitê Especial de Pesquisa COVID-19 da AMHB.
Sintomas da COVID-19 e medicamentos do “gênio epidêmico”. Disponível em: https://amhb.org.br/sintomas-da-covid-19-medicamentos-do-genio-epidemico/?fbclid=IwAR22yw1K7dTZZwpXJuMbrjZL2KFrgcoYo5E8PYNFcBIckb0MfE-lSrvCrwU
Renu Bala et.al. Historical journey of homoeopathy during epidemic diseases in the light of 2019 novel coronavirus pandemic. International Journal of Science and Healthcare Research (www.ijshr.com). Vol.5; Issue: 2; April-June 2020.
Taylor, W. On the Genus Epidemicus – adapted from an article published in Bulgarian in the first issue of the journal Homeopathy Almanac (Sophia, Bulgaria); July, 2001. Disponível em: http://www.wholehealthnow.com/homeopathy_pro/wt10.html
Marino, R. Flu pandemics: homeopathic prophylaxis and definition of the epidemic genius. Indian Journal of Research in Homoeopathy. Vol. 6, No. 1 & 2, January – June 2012.